Nossa Matrix tem céu e inferno: redes sociais e portais de notícias
Por os anônimos raivosos destilam seu ódio, inveja e recalques?
Bia Kunze
30/01/2013 às 15h00
Estamos habituados a nos referirmos ao mundo virtual como a “Matrix”. Muita gente anseia desesperadamente pelo momento do dia em que farão login em seu universo paralelo.
No último fim de semana, cheguei à conclusão que mesmo a Matrix não é uma só. Ela tem duas versões, “Matrix Céu” e “Matrix Inferno”.
O céu são as redes sociais. Todos são lindos, inteligentes, espirituosos. São preocupados com causas sociais, engajados e imensos respeitadores do próximo – pelo menos a julgar pelos milhões de frases de auto-ajuda compartilhadas à exaustão diariamente no Facebook.
O inferno são as seções de comentários dos portais noticiosos. Basta pegar notícias de grande repercussão, como ações policiais, sociais e políticas.
Jornalistas ficam confusos quando precisam de um “termômetro virtual” para saber o que a população acha de determinados acontecimentos. Foi assim com a desocupação da cracolândia e com a internação compulsória de viciados. A população de São Paulo é contra ou a favor?
Nas redes sociais as pessoas estavam piedosas, cobrando atitudes do poder público. Nos portais, preconceituosas, reacionárias e até fascistas! Afinal de contas, qual é o mundo real? O que as pessoas realmente pensam?
Vejam bem: não estou querendo aqui pautar o certo e o errado. Você pode considerar correta ou não a internação compulsória de viciados em drogas. Achar que dependentes químicos precisem de ajuda além de sua vontade própria, ou que tal atitude é uma bondade disfarçada, regida pela especulação imobiliária.
Pontos de vista A questão é a virulência das opiniões e os argumentos utilizados para defender pontos de vista.
Até tragédias podem nos surpreender, como o incêndio da boate em Santa Maria. O tema parece unanimidade, não? Quem não se comove com a morte brutal e irresponsável de duas centenas de jovens? Pois bem, houve quem alegasse que morrer ao sair para se divertir numa casa noturna fosse castigo divino. Houve quem achasse que a tragédia poderia ter acontecido em estados pobres, mas não no RS. Houve quem achasse um “desperdício” serem universitários, que gente com grau de escolaridade menor faria menos falta!
Opinião é uma coisa. Incitar o preconceito, a violência, o crime, é outra. Os portais estão atentos a isso para evitar dores-de-cabeça jurídicas. Durante a doença do ex-presidente Lula, a Folha de S. Paulo simplesmente aboliu a seção de comentários. Agora o jornal divulga novas normas na moderação.
Pessoalmente, achei as novas medidas equivocadas. Fora o uso de termos de baixo calão e agressão explícita, que devem mesmo ser banidos, o que mais será levado na hora de escolher quem será barrado?
Se o problema é a sensação de falso poder que ganham os anônimos, bem… basta ter em mãos o IP e o Código Penal e tomar providências legais. Mas talvez eles sejam tantos que os veículos ficam com preguiça de ir atrás de todo mundo. Há comentaristas da Folha com três mil comentários postados. O jeito mais eficiente – e rápido – é podar pra valer se não quiserem o Ministério Público na cola. A celeridade do Jornalismo digital não combina com a morosidade da justiça.
Fofura e perda de tempo
Agora o que eu queria saber mesmo é: por que as pessoas perdem tanto tempo com isso? Por que postar 3 mil comentários num jornal? Enquanto estão no céu, ou seja, nas redes sociais, usando seu próprio nome e mostrando a cara, até compreendo que queiram posar de gente boa, fofa e feliz. Viver em sociedade é batalhar para ser aceito e a fofura é o caminho mais simples. Mas e os anônimos raivosos, que encontram um canal para destilar seu ódio, inveja e recalques? Por que fazem isso, se é sabido que não mudará em nada suas vidas?
Já não sei mais se o mundo é povoado por uma maioria de pessoas boas ou más. Às vezes acho uma coisa, às vezes acho outra. E quando desligo o computador, constantemente me pergunto: afinal, tomei a pílula azul ou a vermelha? Não dá mais para saber.
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