O politicamente correto é uma forma de automatismo — uma forma de ver o mundo que deseja substituir a verdadeira vida por uma série de automatismos. O politicamente correto enrijece a vida, que, sob o domínio dele, deixa de expressar sua riqueza, sua complexidade.
Como o politicamente correto enrijece a linguagem? Mudando o nome das coisas, dos fatos, para desvinculá-los da realidade. Um aborto, por exemplo, passa a receber o nome de "direito de escolha da mulher", exatamente para arrancar da palavra "aborto" o seu real sentido: assassinato de um bebê.
É uma tentativa de tornar a linguagem neutra. Mas não existe linguagem neutra. Na verdade, trata-se de um jogo linguístico que pretende esconder a realidade. É uma forma de enrijecimento da linguagem: no lugar da realidade, da verdade, da luta entre bem e mal, a linguagem passa a ser controlada pela camisa de força do politicamente correto — e passa a expressar conceitos ideológicos, manipulações ideológicas que pretendem congelar os comportamentos.
Assim, a criança que cantava
Atirei o pau no gato
Mas o gato não morreu
Dona Chica
Admirou-se
Do berro
Que o gato deu
agora canta, para alegria de quem pretende enrijecer a linguagem e controlar os comportamentos:
Não atire o pau no gato
Por que isso não se faz
O gatinho é nosso amigo
Não devemos maltratar
Os animais
Quando o politicamente correto não é trágico — como no exemplo do aborto —, ele é cômico, ele exige a piada, ele é uma piada em si mesmo. O problema é que avança sobre nós o tempo em que essa linguagem substituirá a realidade. Então tudo se tornará trágico.
Rodrigo Gurgel
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