Felipe Moura Brasil - Aceitar premissas de marqueteiros é coisa de militante e inocente útil, não de jornalista.


FHC disse à Jovem Pan que não faria objeção a uma eventual aliança entre PSDB e PT – sim: o PT do mensalão e do petrolão – contra Jair Bolsonaro no segundo turno.

Embora o presidenciável Geraldo Alckmin tenha se apressado a minimizar o desgaste eleitoral, escrevendo no Twitter que “Não tem aliança com o PT, nem com o Bolsonaro, meu compromisso é com você!”, a declaração de FHC, pelo menos em matéria de ideologia, tem coerência. O PSDB é mais próximo do PT que de Bolsonaro.

Além de defender a descriminalização das drogas e do aborto, o próprio FHC declarou em 2005 que o que separa PT e PSDB não é nenhuma diferença ideológica, mas pura e simplesmente a disputa pelo poder – ainda que o ex-presidente tenha amarelado para pedir o impeachment de Lula naquele ano, quando estourou o escândalo do mensalão.

Em 2014, FHC afirmou: “Sou de esquerda, mas ninguém acredita.”

Só não acredita quem caiu na propaganda petista que pintou o PSDB como “direita” só por estar, dentro do campo ideológico esquerdista, à direita do PT.

Privatizar um par de estatais, como Telebras e Vale do Rio Doce, para fazer caixa em tempos de crise não torna ninguém um defensor direitista do liberalismo econômico.

Tanto que o economista Gustavo Franco trocou o PSDB pelo Partido Novo alegando que seu ex-partido hesita em defender ideias pró-mercado ou mesmo as renega.

Há anos, na verdade, líderes tucanos disputam com petistas quem representa a autêntica esquerda.

No segundo turno de 2006, Geraldo Alckmin tentou abertamente superar Lula em esquerdismo, declarando o seguinte:

"Sou mais à esquerda [do que ele] no apreço à democracia e no sentido econômico."

Só mesmo alguém forjado em ambiente esquerdista para considerar que o apreço à democracia cresce conforme o grau de esquerdismo do indivíduo; e para vestir uma jaqueta e um boné com símbolos de estatais, como fez Alckmin na ocasião, a fim de provar que não é “privatista”, como a campanha petista o acusava.

Em 2014, Aécio Neves disse: “Para a direita, não adianta me empurrar que eu não vou.”

No mesmo ano, Danilo Gentili perguntou ao senador tucano Aloysio Nunes: “Quem é mais esquerda: PT ou PSDB?”

Nunes respondeu: “PSDB.”

Em 2015, José Serra, hoje investigado por supostos pagamentos da Odebrecht para suas campanhas, também se disse “mais à esquerda que o PT”, que classificou de “partido de corporações”.

Até outro dia, portanto, toda a cúpula tucana reivindicava publicamente sua credencial esquerdista, inclusive Alckmin, que também responde por supostos pagamentos da Odebrecht para suas campanhas, no caso 10 milhões de reais de caixa dois.

O PSDB se diz de Centro na corrida eleitoral de 2018, mas essa posição avulsa, que busca descolar o partido do recente desgaste da esquerda no país, é tão ou mais recente que o liberalismo professado por Jair Bolsonaro.

O deputado é confrontado diariamente com seu histórico de votações, que indica uma mentalidade estatizante, e responde que evoluiu.

A afetação tucana de neutralidade e moderação entre dois alegados extremos, Lula à esquerda e Bolsonaro à direita, também tem de ser confrontada com o histórico de declarações e atos de Alckmin e da cúpula do PSDB, e com os métodos financeiros e apoios políticos utilizados para chegar ao poder.

Aceitar premissas de marqueteiros é coisa de militante e inocente útil, não de jornalista.

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