Passados mais de 10 anos do debate entre Olavo e Dugin, temos a comprovação empírica e inquestionável de que muitos de fato fizeram propaganda de livros sem nem mesmo ler a orelha. A verdade é filha do tempo
É próprio do idiota útil pequeno burguês acreditar que a sua adesão ao intelectualismo e à alta cultura o põe acima das narrativas políticas, pairando num Olimpo esotérico de beatitudes sem se sujar com a maquinação satânica que abarca e se utiliza exatamente deste tipo de orgulho burguês. Essa afetação é a forma requintada do bom e velho senso de superioridade pela ignorância típico do brasileiro médio. Diante da demonstração da sua insuficiência, reclamam de "ad hominem". Um monte de gente vai curtir isso aqui achando, cada um, que falo dos desafetos das panelas a que pertencem, quando estou falando de um problema seríssimo que vai muito além das preferências intelectuais a que tantos se entregam e se acomodam.
Dugin tem sempre uma língua dupla (às vezes tripla). Ao dizer rejeitar o liberalismo, ele finge ser contra o indiferentismo espiritual e o apego ao indivíduo, coisa que afetou dramaticamente o cristianismo e com isso seduz tradicionalistas. Mas, na verdade, ele só quer derrubar no ocidental toda desconfiança em relação ao Estado, fruto não do liberalismo, mas exatamente dos morticínios produzidos pelas ideologias que ele agora quer restaurar todas numa síntese mágica. Um novo projeto estatista totalitário agora com motivos supostamente sagrados.
Muitos sites e grupos conservadores poderiam ter caído na armadilha que caiu o 5º Elemento. Alguns só não caíram porque foram avisados a tempo, outros não cairão porque a rateada dos rapazes pegou muito mal. E outros ainda logo irão se revelar. Mas o fato é que um certo constrangimento atingiu o seio desse duguinismo já envergonhado da direita e isso os tornará mais sutis e menos descarados. O primeiro sintoma do duguinismo disfarçado ou, no mínimo, da indiferença suspeita, é o foco exacerbado nas imoralidades da decadência ocidental, nas conspirações financeiras e nas sociedades secretas e seu poder nos governos ocidentais. Tudo muito bem disfarçado através da omissão das mesmas ligações e tramas envolvendo Rússia, China e paisecos do Brics.
Quem criou o BRICS foi o financista e bilionário Goldman Sachs, para depois ser mobilizado por Putin. Uma combinação incompreensível para quem acha que a Rússia é resistência ao globalismo ocidental.
Na "tradição" defendida por Dugin, a Serpente representa o conhecimento e Deus, a ignorância do obscurantismo. Apenas um lado dessa corrente se desenvolveu para o que hoje chamamos de materialismo, individualismo e modernismo, o que é facilmente identificável como algo ruim por cristãos. Mas há um outro lado bem definido, que evoluiu para um "tradicionalismo" com o qual muitos conservadores flertam sem medo e por um certo anseio por conhecimentos aprofundados. O prof. Olavo alertou mais de uma vez sobre isso. Juntem os pontos.
Quem cai no duguinismo, em geral, é quem estuda e fica impressionado com suas descobertas. No Brasil, quem estuda um pouco vira logo um sabichão, enquanto quem não estuda até preserva algum senso de detecção de picaretas como o Dugin. Então, pra não virar o especialista burro é preciso estudar muito mais para chegar no nível de quem não estudou nada e percebe o trombadinha no sinal. É o paradoxo brasileiro.
"Deixa q vou usar o dugin contra o globalismo e depois jogo ele fora", diz o conservador expert. É a velha história do "vou dar com q cara na mão dele".
O liberalismo criticado pelo dugin não é aquele do indiferentismo e da liberdade de pensamento, pois deste ele está se beneficiando bastante (e este sim poderíamos rejeitar em nome da verdade conhecida). O negócio dele é só minar as defesas ocidentais contra a concentração totalitária do poder estatal que ele promete.
Antes e depois da revolução russa, os ocultistas ocuparam o teatro russo como esconderijo para o desenvolvimento e estudo da mágica ritual, seja como diafarce contra a vigilancia czarista ou o materialismo oficial bolchevique. Esteve na origem do Círculo Yuzhinski, formador de Dugin, e na escola do serviço secreto, até chegar à profunda influência na política externa russa atual por meio de Putin. Foi graças ao teatro russo que as seitas maçônicas e esotéricas mantiveram seu poder e sem isso não é possível entender as palavras de Dugin.
Cristian Derosa
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