O horror e a doçura em Dostoievsky:

Aos 27 anos, quando sua carreira como escritor começava a deslanchar, Dostoyevsky foi condenado à morte por fuzilamento juntamente com alguns amigos, por terem lido um documento proibido que criticava o regime czarista russo.

O jovem escritor assistiu seus amigos sendo conduzidos à morte em praça pública. Eles foram encapuzados, amarrados, e postos como alvos ao pelotão de fuzilamento. Então deu-se o ritual da morte. Tambores rufando, o grito de "apontar", as armas sendo engatilhadas e, no que Dostoyevsky acreditava serem seus últimos segundos de vida, seu irmão veio em mente.

Repentinamente surge um guarda imperial a cavalo, trazendo a comutação da sentença de morte de Dostoyevsky e seus amigos. Alguns minutos de galope a mais teriam sido suficientes para que a humanidade nunca tivesse sido brindada com as obras primas "O Idiota", "Os Demônios", "Crime e Castigo", e "Os Irmãos Karamazov".

Mas o cavalo chegou, e com ele a nova sentença. Não seriam fuzilados, mas foram condenados a quatro anos de trabalhos forçados na Sibéria, na prisão chamada Casa dos Mortos, título dado ao local para expressar o horror das penas físicas e tratamento cruel que os prisioneiros recebiam.

A descrição que Dostoyevsky faz da Casa dos Mortos lembra muito os campos de concentração pelos quais Viktor Frankl passou. Dostoyevsky relata que os prisioneiros dormiam empilhados, sem coberta - no frio siberiano! -, e que a tortura e sofrimento foram tamanhos que desencadearam nele um "desarranjo dos nervos", levando-o a ter epilepsia.

Mas o que chama a atenção é que mesmo sabendo do destino de extremo sofrimento e dor que o aguardava, com enorme probabilidade de morte devido às condições precárias da prisão, Dostoyevsky escreve uma carta amorosa e bela a seu irmão, despedindo-se antes de partir para a Sibéria.

A forma como o jovem escritor russo descreve seus sentimentos mais íntimos diante de uma sina terrível é doce, pura, quase angelical, ainda que muito realista, e por ser um misto tão incomum diante de uma situação chocante, resolvi compartilhar aqui. É, sem dúvidas, uma das melhores coisas que já li. Segue:

"Não me deixei tomar pela tristeza nem abatimento. Há vida por toda parte, a vida está dentro de nós, e não lá fora. Haverá pessoas perto de mim, e ser um homem entre os homens e permanecer um homem em quaisquer desgraças, sem se entristecer nem se abater independentemente dos infortúnios que possam acontecer - isto é a vida; este é o objetivo da vida. Eu tomei consciência disso. Essa idéia entrou na minha carne e no meu sangue. Sim, é verdade!" - Fyodor Dostoyevsky, tradução minha.

Bruna Luiza

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