Para quem zela pela sobrevivência do seu cérebro num tempo de naufrágio universal da inteligência, nada mais urgente do que compreender o que é realmente “desinformação”. O uso corrente da palavra como rótulo infamante para denegrir qualquer opinião adversa é garantia segura de que as verdadeiras operações de desinformação passarão despercebidas, condição necessária e quase suficiente do seu sucesso.
Só há dois tipos de desinformação genuína, e cada um deles requer muito mais planejamento e execução cuidadosa do que o mero vício jornalístico de espalhar mentirinhas ideologicamente sedutoras.
O primeiro tipo – e, de longe, o mais importante – é aquele que tem como alvo não o público em geral, a massa ignara, e sim os homens do poder, os que tomam decisões de grande alcance. Dificilmente uma dessas criaturas se deixa orientar pelo que sai na mídia popular. Para influenciá-las é preciso colocar no seu entourage (ou conquistar mediante suborno, chantagem etc.) assessores técnicos que sejam da sua plena confiança. E mesmo estes têm de ser muito prudentes no manejo do fluxo de informações que levará seus chefes a tomar as decisões erradas, favoráveis ao inimigo que controla de longe a situação. A importância dessas operações é imensurável, muito mais do que o cidadão comum pode imaginar, e ninguém foi (e é ainda) mais hábil em manejá-las do que a boa e velha KGB (atual FSB). Graças à pletora de documentos secretos revelados após a queda da URSS, hoje sabe-se que desde os anos 40 os agentes soviéticos moldaram a seu belprazer algumas das principais decisões estratégicas do governo de Washington no cenário internacional, induzindo-o a trabalhar contra os interesses mais vitais da nação americana.
O exemplo mais claro e didático está no livro Operation Snow: How a Soviet Mole in FDR’s White House Triggered Pearl Harbor, de John Koster (Regnery, 2012). “Mole” (toupeira) é, no jargão dos serviços de inteligência, o termo técnico que designa o agente infiltrado. A toupeira, no caso, foi Harry Dexter White, alto funcionário do Tesouro, homem de confiança de Franklin Delano Roosevelt e, como os documentos comprovam, agente soviético.
A situação era a seguinte em 1941. O governo militarista e expansionista do Japão estava dividido entre duas correntes: uma queria retormar a velha guerra com a Rússia. A outra queria ajudar os nazistas contra as potências ocidentais. A Rússia, sob ataque alemão desde junho, não podia oferecer resistência eficaz aos japoneses do outro lado do território. Profundo conhecedor da língua, da cultura e da política japonesas, e colocado, ademais, numa posição desde a qual podia facilmente influenciar as decisões econômicas do governo Roosevelt, Harry Dexter White foi contratado pelos soviéticos para criar artificialmente um conflito entre o Japão e os EUA. A seqüência de memorandos e estudos estratégicos com que ele remoldou para pior as relações econômicas entre os dois países foi uma obra de gênio, levando Roosevelt a impor às importacões japonesas de petróleo limitações drásticas que do ponto de vista americano pareciam simplesmente razoáveis, mas que no contexto japonês, e em língua japonesa, soavam como verdadeiras declarações de guerra. O Japão respondeu com o ataque a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941 – não por coincidência, um dia depois que a Rússia, livre da ameaça nipônica, lançava aos alemães um contra-ataque maciço.
Psicologicamente, Pearl Harbor é ainda hoje um símbolo aglutinador do patriotismo americano, mas, em termos substantivos, foi uma tremenda vitória da desinformação soviética.
O outro tipo de desinformação é antes uma obra de engenharia social. Não se dirige ao governo para moldar suas decisões, mas, ao contrário, vem do governo e de seus centros de poder associados e desce para a massa popular, depois que as decisões já estão tomadas e é preciso, para implementá-las, conquistar o apoio do eleitorado, mantê-lo na total ignorância do que os altos círculos estão fazendo ou ajustar sua conduta aos padrões exigidos pela nova política.
Pode-se chamar esses dois tipos de micro e macrodesinformação. As dificuldades são consideráveis em ambos os casos, mas de natureza bem diversa. Se o primeiro é inviável sem o máximo de sigilo e o manejo fino do fluxo de informações, o segundo requer o controle completo dos meios maiores e mais prestigiosos de difusão, podendo no entanto coexistir com alguma contestação menor – ou marginal — que, estatisticamente, não afete os sentimentos da massa popular.
No Brasil essa condição é facílima de alcançar, pois a grande mídia foi sempre dependente de verbas governamentais e não se atreve a morder a mão que a alimenta. Foi assim que os maiores jornais e canais de TV consentiram em ocultar a existência do Foro de São Paulo até o momento em que, dominador completo da situação continental, este já podia se exibir em público sem maiores riscos.
Nos EUA a coisa teve de ser precedida de um longo e complexo processo de concentração da mídia nas mãos dos grupos globalistas que hoje disputam com a Rússia as afeições do bloco islâmico. Quando esses grupos colocaram Barack Hussein Obama no governo para minar o poder nacional dos EUA e operar um giro de 180 graus na política externa americana, fazendo do antigo aliado de Israel o maior protetor que os radicais muçulmanos já tiveram no Ocidente, a mídia já estava preparada para ocultar não somente a biografia altamente comprometedora do presidente, mas até algumas das suas executive orders mais ambiciosas e daninhas, que entram em vigor sem que a população fique sabendo de nada.
Proveniente do Diário do Comércio, 10 de janeiro de 2013
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